O inquérito da Operação Sermão aos Peixes, que apura desvios de recursos da saúde do Maranhão, diz que há robustos indícios de que parte da fraude era feita por meio de empresas de fachada que emitiam notas fiscais frias em prol das terceirizadas diretamente responsáveis pela administração dos recursos destinados ao sistema de saúde do estado. A Polícia Federal usa como exemplo para explicitar o modus operandi das fraudes uma tabela de pagamentos realizados a essas empresas laranjas em 2014. Na época, quem estava à frente da Saúde do Maranhão era o ex-secretário Ricardo Murad, homem forte da então governadora Roseana Sarney (PMDB).
Em depoimento à Polícia Federal em 2016, quando foi conduzido coercitivamente a depor, Ricardo Murad admitiu que não havia controle algum dos recursos que eram transferidos da Secretaria de Estado da Saúde (SES) aos institutos Cidadania e Natureza (ICN) e Bem Viver, entidades supostamente sem fins lucrativos contratadas pelo próprio secretário para administrar unidades de saúde do estado.
O esquema funcionava da seguinte forma: para sacar os valores milionários, que eram muito superiores ao percentual referente à taxa de administração – cerca de 5% dos recursos mensalmente repassados a essas terceirizadas –, foram criadas empresas fantasmas para emissão de notas fiscais frias (sem efeitos tributários) que serviriam apenas como canais para escoar os vultosos recursos, sem serem barrados nos mecanismos de fiscalização.
A Polícia Federal identificou pelo menos três empresas de fachada usadas para desviar os recursos públicos. Só em 2014, um total de R$ 858.049,78 foram sacados pelas terceirizadas para “quitação” das notas frias.
O inquérito policial ressalta ainda que as empresas – que sequer existiam ou não tinham funcionários – emitiam as notas frias para dar uma “aparência legal” aos desvios e esconder seus reais beneficiários.
A PF usa ainda como referência para demonstrar como funcionava o esquema microfilmagens dos cheques sacados, nas quais é possível identificar os nomes das empresas fantasmas. Os investigadores descobriram que já no ano de 2014, as empresas de fachada criadas eram controladas pelo funcionário do IDAC, Valterleno Silva Reis, “testa de ferro” que efetuava os saques na “boca do caixa” e entregava para os verdadeiros beneficiários dos desvios.
Valterleno Silva Reis foi preso pela PF com R$ 70 mil em espécie. Ele e o dono do instituto, o advogado Antônio Aragão, reconhecido como importante colaborador de Ricardo Murad no esquema, foram presos no último dia 2, mas, com a ajuda de um advogado ligado ao ex-secretário de Saúde, foram beneficiados com o habeas corpus e vão responder em liberdade.
Indícios de caixa dois
Um dos detalhes do inquérito policial que pode remontar para o uso de caixa dois para campanhas eleitorais por meio dos desvios é a fotocópia de um cheque mostrando que um dos diretores do IDAC sacou R$ 200 mil em dinheiro vivo no auge da campanha das eleições de 2014, mais precisamente no dia 19 de agosto daquele ano.
Para os investigadores, que chegaram a apontar Ricardo Murad como o líder da organização criminosa que efetuava os desvios, o ex-secretário se utilizou do modelo de terceirização da gestão da saúde pública estadual para desviar recursos. Esse sistema permitiu que Murad e a quadrilha envolvida no esquema usassem as verbas federais para enriquecimento ilícito e financiamento de campanhas políticas.
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