Kennedy Alencar*
O pré-candidato do PSDB, José Serra, fez um discurso acima da média ao se lançar na disputa pelo Palácio do Planalto no sábado, 10 de abril, em Brasília. Foi longo, mas mostrou conteúdo e, acima de tudo, não fugiu do confronto com o PT e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Serra evitou criticar diretamente o presidente e a pré-candidata petista, Dilma Rousseff. Não citou a palavra PT. Mas seus torpedos tiveram endereço certo.
Começou jogando vacinas contra o "nunca antes neste país" usado com frequência por Lula. Lembrou que o país de hoje, melhor do que o passado, é resultado de um processo de 25 anos, desde a redemocratização em 1985. Ao falar de conquistas, como o fim da inflação com o Plano Real, disse: "Não foram conquistas de um só homem ou de um só governo, muito menos de um único partido. Todas são resultado de 25 anos de estabilidade democrática, luta e trabalho. (...) O Brasil não tem dono".
Alguém duvida de quem ele está falando?
"O Brasil pertence aos brasileiros que trabalham; aos brasileiros que estudam; aos brasileiros que querem subir na vida; aos brasileiros que acreditam no esforço; aos brasileiros que não se deixam corromper; aos brasileiros que não toleram os malfeitos; aos brasileiros que não dispõem de uma 'boquinha'; aos brasileiros que exigem ética na vida pública porque são decentes; aos brasileiros que não contam com um partido ou com alguma maracutaia para subir na vida", declarou.
Ou seja, soube explorar o efeito devastador do mensalão sobre o PT e certa tolerância de Lula em relação aos anjos caídos do seu partido. "Honestidade, verdade, caráter, honra, coragem, coerência, brio profissional, perseverança são essenciais ao exercício da política e do poder", emendou.
Seria enfadonho comentar cada trecho do discurso. Municiado por pesquisas, Serra explorou pontos fracos do PT e do governo. Vendeu-se como um candidato que não aposta na divisão do país, no confronto entre pobres e ricos. Exibiu seu currículo político e acadêmico, tentando demonstrar que teria mais credenciais do que Dilma para presidir o país. Fez uma espécie de roteiro de programa de governo, abordando temas concretos, como segurança pública, saúde, educação etc.
Serra tropeçou ao transmitir emoção. Ou melhor: até tentou, mas, tímido, não mostrou naturalidade. No entanto, foi muito feliz ao falar do pai, "um modesto comerciante de frutas no mercado municipal" de São Paulo. Lembrou sua origem humilde, pouco conhecida do grosso do eleitorado devido à imagem de elitismo do tucanato. É emocionante a frase sobre seu pai: "Ele carregava caixas de frutas para que um dia eu pudesse carregar caixas de livros".
Encerrar com Guimarães Rosa foi um belo gol. "O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem". Serra mostrou coragem.
Apesar da desvantagem de lutar contra a candidata de um governo com alta popularidade, ele tem as suas armas. O mote "o Brasil pode mais" é a única construção possível para criticar Lula o suficiente a fim de enfraquecer Dilma, mas sem parecer raivoso.
Resumindo, foi um bom começo de campanha. O tucano fez um discurso que motivou sua tropa e obteve manchetes positivas na mídia. E, já no começo desta semana, estava confrontando Dilma, que escorregou ao insinuar que exilados na ditadura teriam tido atitude covarde na comparação com quem aderiu à luta armada.
O PT está mais preocupado do que aparenta.
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